quarta-feira, 9 de setembro de 2015

Impactos do lixo marinho e Ação “Praia Local, Lixo Global”

Os impactos ambientais mais evidentes estão relacionados à morte de animais. Esse problema tem sido considerado tão grave, que já existem registros de ingestão ou enredamento em lixo para a maioria das espécies existentes de mamíferos, aves e tartarugas marinhas.


Atualmente, o lixo deixou de ser apenas um problema sanitário em zonas urbanas e tornou-se um dos principais grupos de poluentes em ecossistemas marinhos, inclusive em áreas não urbanizadas. Juntamente com outros grupos de poluentes, como petróleo, metais pesados e nutrientes, o lixo tem ameaçado a saúde do ambiente marinho de diversas maneiras. 


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Os impactos ambientais mais evidentes estão relacionados à morte de animais. Esse problema tem sido considerado tão grave, que já existem registros de ingestão ou enredamento em lixo para a maioria das espécies existentes de mamíferos, aves e tartarugas marinhas. Muitos animais confundem resíduos plásticos com seu alimento natural. Sua ingestão pode causar o bloqueio do trato digestivo e/ou sensação de inanição, matando ou causando sérios problemas à sobrevivência do animal. O enredamento em materiais sintéticos, como resíduos de pesca, também é muito perigoso. Isso tem afetado especialmente populações de animais com hábitos curiosos, como focas e gaivotas, seja no Havaí ou em ilhas sub-antárticas. 
Em estudos realizados sobre a quantidade e composição de resíduos flutuantes, em praias, e/ou depositados no leito marinho, os plásticos são os mais freqüentes. Fatores como seu elevado tempo de decomposição, sua abundante utilização pela sociedade moderna e ineficácia ou inexistência de programas de gerenciamento de resíduos sólidos explicam essa constatação. Um tipo de plástico pouco conhecido são as esférulas plásticas, nibs ou pellets. Os nibs possuem poucos milímetros de diâmetro e são matéria prima para a fabricação de produtos plásticos, sendo perdidos em grande quantidade durante seu manuseio e transporte. Na Nova Zelândia, por exemplo, foram verificados depósitos com mais de 100.000 esférulas por metro linear de praia. No Brasil, os nibs já foram observados no Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Rio de Janeiro e Bahia, mas provavelmente ocorrem em todo litoral. Apesar do pequeno tamanho, os nibs causam grande preocupação, visto que inúmeras espécies de aves têm ingerido esse tipo de material e, além do dano físico, os nibs podem ser vetores de poluentes químicos, como agrotóxicos, aderidos em sua superfície externa. 
O lixo depositado nas praias brasileiras pode ter sido deixado pelos banhistas, transportado pelos rios que cruzam zonas urbanas ou trazido pelas correntes marinhas. Juntos, os ventos alísios (de nordeste) e o padrão de circulação superficial do oceano Atlântico Sul favorecem o transporte dos resíduos flutuantes jogados no mar pelos navios para as praias brasileiras. Uma breve caminhada pelas praias da Costa dos Coqueiros, no litoral norte da Bahia, pode mostrar algumas surpresas, como acúmulo na areia do lixo jogado no mar por navios estrangeiros. Foi isso que aconteceu no verão de 2001 numa caminhada de 10,3 km entre as praias do Forte e Imbassaí, motivando a criação da Ação “Praia Local, Lixo Global” (www.globalgarbage.org) com objetivo de monitorar o problema e buscar soluções. 
Na Costa dos Coqueiros, os impactos do lixo à vida marinha são agravados por se tratar de área de reprodução de tartarugas marinhas, com intensas atividades do Projeto TAMAR. Isso significa que além dos obstáculos naturais, as tartarugas precisam superar o lixo flutuante e aquele depositado na praia para garantir sua sobrevivência.
Além dos danos à vida marinha, o lixo no litoral da Bahia entra em conflito com uma das principais atividades econômicas da região: o turismo. As pesquisas realizadas no Brasil e em outros países mostram que o lixo nas praias também pode causar ferimentos nos banhistas, diminuição das atividades turísticas e danos a embarcações. Por exemplo, na África do Sul, o prejuízo causado pelo lixo ao turismo é da ordem de milhões de dólares; no litoral sul do Brasil foi observado que cerca de 20% dos banhistas já sofreram algum tipo de ferimento associado a lixo em praia; enquanto em algumas regiões dos Estados Unidos o entupimento da entrada de água para a refrigeração do motor com plásticos é a principal causa de danos a embarcações.
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O monitoramento da chegada do lixo internacional em cerca de 70 km de praias praticamente desabitadas no litoral norte da Bahia a partir de 2001 registrou embalagens de mais de 60 países. Estados Unidos, Itália e África do Sul são os países com maior número de embalagens. O plástico é o material mais freqüente, seguido por metais. Isso aumenta ainda mais a gravidade do problema, considerando o elevado tempo de decomposição destes materiais. Atualmente o monitoramento é realizado em um trecho de 141,5 km entre Mangue Seco e Praia do Forte. A intenção é expandir as atividades para o maior número de localidades possíveis. 
Outro poluente pouco conhecido que tem sido monitorado são os sinalizadores (lightsticks) utilizados na pesca de espinhel ou por mergulhadores. Esses sinalizadores são uma embalagem de plástico contento líquido oleoso que produz luminosidade por aproximadamente 12 horas. Perdidos ou jogados no mar, os sinalizadores também se acumulam nas praias. Eles têm sido utilizados inconseqüentemente pela população local para acender fogo, como chaveiros, lubrificantes e até mesmo como bronzeadores, óleo para massagens contra dores musculares e para curar micoses, vitiligo e reumatismo! Apesar dos fabricantes afirmarem que seu produto não é tóxico no caso de contato acidental com a pele, o resultado do seu uso sistêmico e contínuo é desconhecido em longo prazo, podendo se tornar um problema de saúde pública se não for devidamente investigado e avaliado. 
A solução dos problemas aqui descritos passa essencialmente pelo conhecimento científico das origens e impactos dos poluentes em ambiente marinho, afinal apenas problemas devidamente conhecidos podem ser gerenciados. Atualmente a Ação “Praia Local, Lixo Global” conta com três programas em ação. O programa “ID Garbage” busca a identificação das origens do lixo encontrado nas praias da Costa dos Coqueiros, intimamente associado ao programa “Amigos do Lixo”, que reúne pessoas de todo mundo interessadas em recolher e catalogar o lixo encontrado nas caminhadas na Costa dos Coqueiros. Já o programa “Onda Verde” é uma iniciativa que tem o apoio de atletas e surfistas como Wilson Nora e Armando Daltro, buscando a difusão das idéias de “Praia Local, Lixo Global” no mundo do Surf. 
A expansão do trabalho e a busca pela diminuição da poluição marinha por resíduos sólidos dependem muito de novas articulações. Nesse sentido está sendo realizada uma associação com a expedição Aventura no Brasil Costal (www.aventuranobrasilcostal.com.br), programa idealizado pelo jornalista científico Luiz Peazê, que tem o objetivo de difundir assuntos ligados à gestão costeira e educação ambiental através expedição em cruzeiro à vela ao longo da costa brasileira, de sul a norte e de norte a sul, intermitente por no mínimo cinco anos. Os objetivos e ideais convergentes de ambos projetos apontam para uma excelente parceria. Assim, a metodologia e ações de “Praia Local, Lixo Global” poderão ser difundidas em praias de todo Brasil.

Isaac Rodrigues dos Santos (Oceanógrafo) & Ana Cláudia Friedrich (Mestre em Engenharia Oceânica), membros da comissão científica de “Praia Local, Lixo Global”; & Fabiano Prado Barretto, gerente de projetos e idealizador de “Praia Local, Lixo Global”.
Fonte:Ambiente Brasil

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